Passei o domingo inteiro largada no sofá, assistindo tv e lendo o jornal, não queria ter que pensar na possibilidade do meu salário sumir de repente ou vir o trabalho que tanto gosto ser esquecido numa pilha de processos arquivados. Eu poderia arrumar o mesmo emprego em outra revista, mas ter que ouvir todas aquelas cantadas e piadas idiotas até chegar aonde cheguei não valeria o esforço.
Como uma revista pode falir da noite para o dia? Aquele estúpido se suicidou de egoísmo por que não queria encarar a realidade.
Como alguém tão rico consegue essa proeza e deixa dois filhos pequenos largados no mundo com uma mãe que só quer saber de cremes e comprar roupas de marca?
Esse imbecil era o dono da revista, os outros sócios não servem de nada sem a cabeça que conduziu isso tudo até hoje.
Andei investigando sobre o motivo da ignorância depois de receber um telefonema avisando que não precisaria marcar presença na redação por que o senhor Albert teria amarrado a ponta de uma corda no pescoço, a outra em uma arvore, teria subido no teto do seu carro importado e pulado, achei que algum desocupado estava querendo fazer uma piada de mau gosto com a minha cara, mas a verdade era essa mesma. Ele teria descoberto um caso da esposa com o personal training e somado inúmeras dívidas de processos contraídos na sessão de fofocas, aquelas matérias de repórteres amadores querendo subir na vida que invadem o particular de famosos mais do que devem e são processados por difamação entre outros. Matamos uma princesa por causa disso e ninguém aprendeu que limites devem ser respeitados, com isso sobrou para mim que falo sobre moda, saúde e estética ter que ficar de molho enquanto decidem o que farão com o futuro da revista.
Na última página do jornal que estava lendo tinha uma matéria sobre concursos públicos, algo que jamais imaginei, mas como gosto de desafios, quem sabe não será uma solução para o tédio em que me encontro no momento, essa calmaria está me deixando ociosa e infeliz e pensando pelo lado lucrativo, além do salário poderá ser mais uma espécie de laboratório, gosto de viver vários personagens, ser somente uma Melissa me cansa, por isso dessa vez estou empenhada em me tornar uma agente policial, mesmo sabendo que aqui não é nenhum FBI de filmes, quero tentar.
Tenho que estudar aquelas coisinhas chatas que ninguém usa no futuro e que para encher os olhos dos candidatos sempre caem nas provas.
Sempre gostei de armas, filmes de investigação com serial killer, psicopatas e mulheres imbatíveis, mas jamais pensei que um dia isso poderia fazer parte da minha vida. Nos filmes as heroínas sobrevivem nas explosões quando são baleadas ou mergulham em corredeiras, aqui fora tudo fica mais real, elas podem sangrar, morrer e nunca serem consideradas heroínas.
Tinha um amigo que era dono de uma firma de segurança e todo final de semana passávamos no sítio dele que ficava em Teresópolis, lá ficávamos horas brincando de tiro ao alvo com latinhas de cerveja e maçãs. Meu primeiro tiro foi um desastre, voei para trás após apertar o gatilho e cai no chiqueiro, fiquei com o braço dolorido e roxo por causa do disparo e no dia seguinte estava pronta para outra.
À noite cada hóspede dormia com uma arma debaixo da cama para evitar ser surpreendido por algum ladrão entrando pela janela, isso porque a família toda era desesperada pelo fato de ter tido dois parentes seqüestrados naquela época, donos de firma de segurança não deveriam sentir esse medo, afinal estavam seguros.
Escolhi logo a mais poderosa, uma silenciosa prateada que vinha em uma maleta estilo 007, não pude deixar de bater uma foto com um charuto cubano na mão e nesse instante pude me imaginar naquelas roupas pretas e coladas no corpo como a “Super Mel”.
Moveis da família real misturados com um toque de serra e peças de antiquários decoravam o interior da casa, dando um ar de mistério e desconfiança, eu que não me arriscaria em sair do quarto até o galo cantar.
Antes de nos recolhermos tomávamos algumas bebidinhas, chás e petiscos caseiros, como queijo, goiabada, doce de leite e um rodízio interminável de palmito, tudo feito naquele lugar. Sentávamos em volta de uma fogueira e tocávamos algumas musicas no violão, depois cada um se dirigia para o seu aposento. O quarto que eu sempre ficava tinha uma cama que foi da princesa Isabel, dava prazer só de imaginar que dormiria como uma nobre, uns oito travesseiros de pena de ganso ocupavam metade do colchão, um lugar perfeito para quem não precisa acordar cedo. Antes de cair no sono enchia a banheira de essências e ficava horas por lá até enrugarem as pontas dos dedos dos pés.
Lembranças boas que tinha esquecido por um tempo e que hoje ao recordar tenho a certeza que tudo tem um sentido, talvez essa nova fase seja mais interessante do que a que estou passando nesse momento, um pouco de aventura e regalias fazem bem para qualquer pessoa, terei apenas uma semana para organizar meus neurônios e quem sabe ser uma heroína real, quanto à minha profissão atual, estou saindo de férias por um período do meu local de trabalho, mas continuarei com o site da internet ativo passando minhas dicas de sempre e aguardando uma solução para a redação por que se parar de escrever piro de vez, com o tempo tudo se ajeita, a revista número um não rasga assim tão facilmente, vamos esperar o inventário sair e uma reunião que elegerá o substituto.
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