sábado, 6 de junho de 2009

CULTO NA FEIRA AOS SÁBADOS

Por que será que as pessoas sentem tanta necessidade em serem notadas? Algumas religiões insistem em fazer uma lavagem cerebral de uma forma tortuosa, gritam tanto que não conseguimos entender o que falam e assassinam nosso precioso português.
Tem um grupinho bem furreca que escolheu a praça em frente do meu prédio para fazer um verdadeiro ritual de massacre. Eles chegam as 8:00 horas da manhã de um sábado que poderia ser um dia relaxante com suas bíblias embaixo do braço, instalam umas quatro caixas de som possantes no meio da praça, que deixariam qualquer DJ de rave no chinelo e além de microfone usam um megafone para acordar um sono profundo em segundos. Começam cantando músicas de louvor até a entrada triunfal do convidado do dia, um ex presidiário, ex traficante, ex viciado e atual pastor. Hã? Sim, ele acha que foi salvo pela palavra de Deus e agora virou anjinho, não fuma, não bebe, não faz mais besteira e se bobear nem transa, tá bom que acredito nisso!
Respeito todo tipo de religião, do praticante fervoroso ao ateu desconfiado, mas daí a me obrigar a ouvir tanta besteira é falta de respeito. Eles gritam tanto que parecem estar entrando no meu corpo como exorcistas desenfreados, chego a sentir medo e nada diminui o barulho, já tentei algodão nos ouvidos, travesseiros na cabeça, me tranquei no banheiro, abri o chuveiro, liguei meu humilde som no máximo e nada ameniza o barulho infernal. Dia desses perdi a linha e convidei um amigo para tocar bateria na varanda, de nada adiantou, eles mandaram buscar mais caixas de som, olharam para cima e falaram:”você que está debochando da palavra divina está perdido precisando de orações de nos irmãos, você que tenta fugir ainda há esperança nessa manhã, você derrotado, perdido na cachaça, que vendeu sua alma ao diabo e está vivendo na desgraça, hoje será salvo pela palavra!”
Eis que surge uma mulher com metros de cabelo amarrados abaixo da nuca e diz, ou melhor, grita furiosamente: “estamos aqui pra resolve o seu pobrema, porque eu já me prostitui na vida irmãos, já fui lambida por um cachorro de rua depois da noitada, fugi de casa e abandonei meus fios ainda pequenos pra viver com satanás e hoje sou a sua salvação, aceite minhas palavra como istrumento para a graça. Me colocaram na terra para matar, para roubar, mas resisti e hoje estou aqui nessa manhã bunita pra te salvar”. Ela olha para um casal apaixonado que caminha de mãos dadas que por infelicidade deles resolveu passar em sua frente e continua sua missão de terrorista:”você que traiu sua muié na noite de ontem enquanto ela cuidava dos seus fios, junte aqui irmão, você será abençoado!” e o casal começa a brigar. Não satisfeita olha para um senhor que passeia com sua netinha na praça e diz:”você irmão, que matou, esquartejou e escondeu o corpo do difunto será salvo pelas minhas mão. Eu tenho o poder de curar, tenho o dom de passar a palavra de Jesus Cristo e vou te fazer o homem mais santo a partir de agora”. Todos olham para o ancião enquanto sua neta sai correndo e chorando desesperadamente.
O convidado retorna ao microfone e continua sua história:”Quando eu tava preso vi a luz me chamando e tive a certeza que não estava só (estaticamente são mais de 40 presos em uma cela por metro quadrado, impossível estar só nessas horas), quando tava preso me fizeram de muié e mesmo assim não desisti, quando eu tava preso comi fezes no café da manhã e essas fezes foram glorificadas e transformadas em pão, quando eu tava preso apanhei tanto que fiquei surdo (talvez por isso esse infeliz grite tanto) e por fim, quando tava preso encontrei meu caminho e agora sou mais puro que água de filtro de barro”.
Impressionante a força de vontade que essas pessoas tem em nos obrigar a acreditar que um indivíduo assim possa ser plenamente feliz, claro que a esperança deve existir e todos merecemos uma segunda chance mas daí a me obrigar a acreditar em suas palavras é demais para minha cabeça.
Sábado de manhã para mim passou a ser um martírio por causa dessa feira livre e já na sexta feira eu rezava incansavelmente para o dia amanhecer em clima de temporal. Quando chovia essas pessoas não davam as caras e eu podia dormir até tarde com os anjos, quando fazia sol, panelas e colheres estavam a postos para começar meu contra ataque que durariam umas incansáveis três horas. Agora, se realmente eles acreditam tanto nessa fé sem educação não deveriam haver barreiras como tempo ruim, por que quem realmente crê atravessa um oceano sem se molhar e não será assim que mudarão meus pensamentos, pelo contrário, reforçarão a tese que são uns chatos querendo tirar a paz de pessoas tranqüilas procurando sossego no final de semana.
Um dia estava tão incomodada com isso que cheguei a cogitar a hipótese de comprar um home theater para passar um filme de terror ou algum clipe do Kiss, cheguei a imaginar a cena de meia dúzia de seguidores querendo atear fogo na minha casa, como na inquisição que queimavam as mulheres com Qi superior na fogueira da praça, o que me protegia desses terroristas obcecados eram quatro lances de escadas, minha poodle e três rottweilers que ficavam enfurecidos com a presença de estranhos esquisitos como eles. Até hoje não achei uma fórmula para simplesmente meditar e ensurdecer meus preciosos ouvidos para tanta besteira gratuita, o melhor foi me trancar em um quarto abafado até que retirassem suas tropas da minha vista. Ir a delegacia, chamar um guarda local ou denunciar na prefeitura não resolveria esse problema, afinal nossos bem feitores estavam na captura de futuros fiéis, ou seja, estavam caçando marginais pelas ruas que futuramente descobririam essa salvação atrás das grades e retornariam para a cidade com seus depoimentos pós prisão.
Tem certas coisas na vida que infelizmente precisamos ignorar e saber encarar, horas indesejáveis que parecem não acabar jamais.
Eu não poderia fazer nada, apenas esperar acabar e me conformar, cheguei ao ponto de saber todas as letras das músicas, todos os relatos e quando se retiravam, aleluia, a paz retornava ao meu lar... por alguns minutos, por que logo em seguida um grupo de feirantes tocavam forró enquanto guardavam seus legumes, no mesmo esquema anterior, difamando nossa rica gramática e desafinando nas letras musicais. Alguns desocupados que acompanhavam o culto anterior aproveitavam o embalo para tomar umas e outras e caiam no arrasta pé sem hora de terminar. Era mulher mostrando calcinha quando rodava, homem descalço e uma trilha sonora de enlouquecer nervos sensíveis. No repertório um tal de “chupa, chupa”, “o bode e a cabrita”, “vou rasgar você todinha” e para completar “arrebita que vou passar”... socorro!!!!!! Isso parece mais um pesadelo que um dia de descanso e o pior ainda estava por vir, muito funk e sertanejo embolados no cair da noite que duravam uma eternidade para mim e o detalhe, tudo no ponto mais desejado da zona sul.
Sobrava o domingo para relaxar a mente se não fosse acordada com o carro de som do hortifruti anunciando a oferta do dia: “hoje é dia de chicória, de batata e cenoura, quem ta dormindo trate de acordar e venha conferir nossas promoções direto da horta. Ta tudo fresquinho, vem meu povo!”
As vezes fico pensando o que fiz para merecer isso, porque não pesquisei a vizinhança antes de mudar, por que não coloquei janelas acústicas na sala e por que estou aqui até agora? Investi todo o dinheiro que tinha guardado na poupança para comprar esse imóvel, ainda estou pagando as prestações e para isso acabar só com milagre ou uma possível sorte na mega sena.

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